Estive a ver com atenção o programa do dia 13 de outubro do Agora Nós, onde se colocou a questão: há esperança sem Deus? Para dialogar sobre ela estava o meu caro amigo Ludwig Kripphal e o P. Tiago do Barreiro que não conhecia. Impressão? Perplexidade.
Pensava que depois de tanta tinta ou bits escritos com pensamentos e vida sobre ciência e fé, reduzi-la ao que ouvi e foi transmitido para muitos portugueses pelo mundo…. bom… não sei se há esperança sem Deus, mas paciência sem Deus é realmente impossível.
Creio que o P. Tiago é um puro de coração e que a sua entrega a Deus é genuína, mas talvez o nervoso de estar perante as cameras tenha levado a pensar que é preciso ser fora-da-caixa para passar uma mensagem diferente. Mas não será antes pensar sobre a caixa de modo diferente, de tal modo que nos inspire? Infelizmente não me senti inspirado.
Mas também o Ludwig não me inspirou ou o senti convincente. Pelo que ouvi, o que pensa não é diferente daquilo que pensava há uns anos quando tive oportunidade de o conhecer pela primeira vez. Creio ter entrado numa fase de ateísmo cristalizado, mas não sei… posso estar enganado….
Quem me inspirou foram os apresentadores. As questões estavam bem pensadas, colocadas para desconfortar e estimular um diálogo fecundo e cheio de potência para inspirar, mas… toda a excelente preparação que fizeram pareceu-me cair em saco roto. Não mereciam.
Onde quero eu chegar?
O diálogo entre ciência e fé possui uma potencialidade de compreensão da realidade que está para além de tudo o que possamos imaginar. A força de um sentido e significado de Deus e da forma como interage com o mundo, à luz de um diálogo entre ciência e fé, pode transformar as nossas vidas e fazer crescer em nós uma visão do mundo que transforme o mundo
Onde está Deus diante de uma doença injusta ou catástrofe natural?
Já escrevi algo sobre isso, mas o P. Tiago foi excelente na resposta. Está na vítima. Naquele que sofre e morre com essa pessoa. Queres ver o rosto de Deus, olha para a criança com cancro e ama-a. Olha para a criança morta por um tsunami e ali está o Deus morto, não o da fantasia de Nietzche, mas o que está mais próximo de nós do que nós de nós próprios.
Por outro lado, doenças injustas, sofrimentos injustos, mortes injustas, não são a destruição do sentido e significado da vida, mas o sinal de algo no mundo que nos dá plena liberdade de recusar Deus ou de o amar incondicionalmente.
O mundo é contingente.
Tudo o que é material é amor, logo, a dor, sofrimento e morte é o amor que se transforma e por desígnios misteriosos mostra-nos que há mais vida para além da vida.
A história ainda não acabou e se algum dia sofrer ou morrer injustamente aos olhos humanos, espero ao menos fazer a experiência de olhar com os olhos de Deus e ver amor que se transforma. Assim como espero que os que estiverem ao meu redor o façam também.
Há esperança sem Deus?
Se há, em quê?
O Ludwig responde honestamente que não sabe e perante o cenário de estar dentro de um avião a cair opta por gritar de pânico. Consta que o P. António Vieira num debate sobre o choro e o riso disse que ambos choram, uns com lágrimas, outros com gargalhadas.
Inspirado nisso questiono: de que serve um grito de pânico se não tem o objectivo de se dirigir a Alguém de quem se sente tão longe que só com um grito “espera” fazer-se ouvir?