Num outro post referi a tríade ecológica de Bento XVI composta pelas ecologias ambiental, humana e espiritual, onde o Papa “inova” na última. Ao reflectir sobre a Imaculada Conceição, sobre a pureza de Maria e a vida na cidade, Bento XVI adianta um exemplo prático do tipo de poluição que pode haver relativa à ecologia espiritual e dos eco-males associados, encontrando em Maria uma via que ajuda a ultrapassar essa crise ecológica-espiritual. Importa salientar que essa via passa pelo conceito de alma, no qual muitos não acreditam, sobretudo pela noção dualista que a separa do corpo, remetendo-a para a esfera do invisível, imaterial e, por isso esfera especulativa e incredível. Bento XVI na sua “Introdução ao Cristianismo” (pp. 254-260, Principia, 2005) afirmava sobre a alma que «aquilo que amadureceu durante a existência terrena de espiritualidade corporificada e de corporalidade espiritualizada continuará a existir de outra maneira. E a sua existência prossegue porque vive na memória de Deus (…) ‘Ter alma espiritual’ quer dizer exactamente ser querido, conhecido e amado de modo especial por Deus; ter alma espiritual significa ser-se alguém que é chamado por Deus para um diálogo eterno e que, por isso, é capaz, por sua vez, de conhecer Deus e de lhe responder. Aquilo a que, numa linguagem mais substancialista, chamamos ‘ter alma’, passamos a chamar, numa linguagem mais histórica e actual, ‘ser interlocutor de Deus’.»

Tenhamos presente este conceito relacional – diria – de alma. Eis então a leitura de Bento XVI quanto à poluição no âmbito da ecologia espiritual.

«Nós muitas vezes lamentamos a poluição do ar, que em determinados locais da cidade é irrespirável. É verdade: precisamos do empenho de todos para fazer a limpeza da cidade.

E, no entanto, existe uma outra poluição, menos perceptível aos sentidos, mas tão perigosa como a outra. É a poluição do espírito, é o que torna a nossa cara menos sorridente, mais sombria, o que nos leva a não cumprimentar uns aos outros, a não olhar para o outro no rosto. A cidade é feita de rostos, mas, infelizmente, a dinâmica colectiva pode fazer desaparecer a percepção da sua profundidade. Nós vemos tudo superficialmente. As pessoas tornam-se corpos, e estes corpos perdem a alma, tornam-se coisas, objectos sem rosto a serem trocados e consumidos.

Maria Imaculada ajuda-nos a redescobrir e defender a profundidade das pessoas, porque nela existe uma perfeita transparência da alma no corpo.»