Se a matéria é amor e sendo Deus amor, não corremos risco de um certo panteísmo onde se considera a matéria como Deus? A palavra matéria pode adquirir um novo sentido e significado se aprofundarmos melhor o pensamento que suscita a questão.
Existem pontos chave quando pensamos em Deus e no mundo. Para mim, um deles é – e será por muito, muito tempo – a revolucionária intuição que o Papa Francisco teve quando escreveu na Laudato Si’ (84)
“Todo o universo material é uma linguagem do amor de Deus, do seu carinho sem medida por nós. O solo, a água, as montanhas: tudo é carícia de Deus. A história da própria amizade com Deus desenrola-se sempre num espaço geográfico que se torna um sinal muito pessoal, e cada um de nós guarda na memória lugares cuja lembrança nos faz muito bem. Quem cresceu no meio de montes, quem na infância se sentava junto do riacho a beber, ou quem jogava numa praça do seu bairro, quando volta a esses lugares sente-se chamado a recuperar a sua própria identidade.”
Palavra pronunciada
Se o universo é uma linguagem de amor através da qual Deus nos fala, poderíamos afirmar cada um de nós, cada coisa como uma palavra de amor pronunciada por Deus. É claro que neste estilo de pensamento não se pode confundir a palavra pronunciada com Quem a pronuncia e, desse modo, a resposta à pergunta inicial é a de que não corremos o risco de confundir a matéria com Deus.
Mas isto pode levar-nos mais longe, penso. Se cada um de nós é uma palavra de pronunciada por Deus, é possível destruir essa palavra? Apenas se deixasse de ser pronunciada, deixaria de existir. Aquilo que aos olhos de um pensamento actual assemelha-se a destruição, procurando ver cada coisa com o olhar de Deus leva-nos a experimentar que nada se destrói, apenas se transforma.
A dor é o sentir de uma transformação.
O sofrimento é a tomada de consciência dessa transformação.
A morte é a transformação propriamente dita.
Tudo se transforma
Aprendemos na química, através de Lavoisier, que neste mundo nada se cria ou se perde, tudo se transforma. De facto. Mesmo num novo estilo de pensar que procura olhar para a matéria como amor por ser uma palavra pronunciada por Deus, o amor transforma e transforma-se, mas não se destrói.
Não se trata de negar a dor, o sofrimento e a morte, mas contemplar esses aspectos com um novo olhar, e pensá-los com um novo estilo de pensar.
Sem sentido e significado, a dor, o sofrimento e a morte serão sempre um mal.
Com sentido e significado serão sempre indesejáveis, mas não um impedimento a olharmos para as diversas transformações do mundo, incluindo em nós próprios, com deslumbramento. Como dizia Teilhard de Chardin,
“Àquele que tiver apaixonadamente amado Jesus oculto nas forças que fazem morrer a Terra, a Terra apertá-lo-á ao desfalecer nos seus braços de gigante, e ei-lo que, com ela, despertará no seio de Deus.”
Questão: que pensamento suscita em ti uma tomada de consciência de seres uma palavra de amor pronunciada por Deus?