Quando alguém diz ter uma experiência religiosa, o que sustém o seu testemunho?
Quando afirmamos algo como tendo sido inspirado pelo Espírito Santo, não terá sido antes fruto da nossa imaginação?
Se reconhecermos que uma experiência do Espírito Santo é fruto da nossa imaginação, haverá espaço para a experiência religiosa?
As respostas a estas perguntas suscitadas pela leitura Denis Edwards em “Breath of Life – a theology of the Creator Spirit“ pareceram-me interessantes e partilho.
Em primeiro lugar assumir o papel da imaginação humana numa experiência do Espírito Santo não implica negar a experiência religiosa, mas sim – segundo Edwards – reconhecer que esta experiência é sempre filtrada pela personalidade de quem a tem.
Recorrendo a Karl Rahner, Edwards observa que «a experiência do Espírito ocorre, fundamentalmente, na normalidade da experiência humana do mundo» (p. 52). Por outro lado, «a experiência do Espírito (…) não é da mesma ordem que a experiência dos objectos criados, como uma porta, um livro ou uma árvore. É uma experiência muito mais global de transcendência, de abertura ao infinito, uma experiência que ocorre com o contexto e pano de fundo das nossas experiência específicas do quotidiano».
O ponto essencial deste trecho que queria partilhar é a possibilidade acessível a todos de viver uma experiência de transcendência, uns diriam religiosa ou do Espírito Santo, que está “para além” da normalidade de cada dia e que ocorre, precisamente, na normalidade de cada dia.
Será isto possível? Creio que sim … basta ver um pôr-do-sol. Quando a luz do Sol “se apaga”, dá lugar à infinita vastidão de um universo de estrelas.
Miguel,
Esta pergunta é interessante:
«Quando afirmamos algo como tendo sido inspirado pelo Espírito Santo, não terá sido antes fruto da nossa imaginação?»
Infelizmente foges dela quando a mudas para:
«Se reconhecermos que uma experiência do Espírito Santo é fruto da nossa imaginação, haverá espaço para a experiência religiosa?»
O problema não é se há espaço para haver também imaginação. A questão mais interessante é se há aí algo mais que a mera imaginação. Ou seja, se esse espirito santo é uma entidade que existe fora da nossa imaginação ou se é puramente fictícia, como o Pai Natal, Odin, ou a influência astrológica de Júpiter.
Gostava que tentasses responder a essa pergunta. Porque é que haveremos de dar mais credibilidade ao Espírito Santo que à astrologia?
Caro Ludwig,
Porque é que haveremos de dar mais credibilidade ao Espírito Santo que à astrologia?
Boa pergunta. A astrologia vai contra a razão científica, enquanto que o Espírito Santo pressupõe-na para se fazer entender. Não há contradição entre a acção do Espírito Santo e uma explicação científica, tal como escrevi no post, porque essa acção ocorre no quotidiano, ao contrário da astrologia que assenta no que muitos apelidam de pseudociência.
Qualquer aparente contradição da acção e presença do Espírito Santo é meramente motivo de maior estudo entre ciência e teologia, logo, ao contrário de remeter para uma mística astrológica, remete para o diálogo entre os dois saberes de modo a termos uma visão mais profunda da realidade.
Nesse sentido é muito importante haver pessoas como tu que, ao contrário de quererem fazer desaparecer a religião da face da Terra, querem perceber algo sobre essa realidade e contribuem para que crentes como eu a aprofundem.
A minha experiência pessoal é que existe um património de reflexão entre ciência e teologia imenso, que apenas há 6 anos comecei a descobrir, ao passo que sou Cristão desde dos 8 anos.
Contudo não é desprezável que a astrologia esteja em muitas revistas e seja tomada como verdade, pela qual muitas pessoas regem a sua vida, o que lhe dá alguma credibilidade. Mas como é incompatível com uma abordagem Cristã, não se pode ser Cristão e acreditar na astologia. Exemplo: a astrologia concentra a tua atenção em ti mesmo, enquanto o Espírito Santo centra a tua atenção fora de ti mesmo.
Caro Miguel,
Gostei da tua resposta. Embora careça de algum fundamento.
Como dizes correctamente “…essa acção ocorre no quotidiano.”
Deus dá seu espírito “aos que obedecem a ele como governante” e que ‘persistem em andar por espírito’ e não segundo os desejos carnais. (Atos 5:32; Gálatas 5:16, 25; Romanos 8:5-8) Essa força poderosa torna possível aos cristãos demonstrarem “os frutos do espírito” — qualidades excelentes — e ‘actos santos de conduta e acções de devoção piedosa’. (Gálatas 5:22, 23; 2 Pedro 3:11) Se o espírito santo for sagrado para nós, evitaremos fazer qualquer coisa que possa contristá-lo ou impedi-lo de agir em nossa vida. — Efésios 4:30.
Atenciosamente,
Manuel Rodrigues
Parece que Jesus de Nazaré nunca andou preocupado em convencer ninguém acerca das realidades nas quais acreditava, se firmava, e em nome das quais derramou o sangue/a vida.
Falava sempre da vida quotidiana… acredito que ao ver muitos pôr-do-sol, viu aí traços da beleza da Ruah/Espírito de Deus, sim.
Mais que isto, sinto que ele acreditava que a acção maior do Espírito acontece na vida daqueles que acreditam que é possível viver segundo lógicas diferentes das comuns “do mundo”, que é possível viver segundo lógicas que mais nos humanizam, mais nos plenificam, mais nos tornam o “Nós” que estamos “desenhados” para ser…: Verdade, Amor, Liberdade, Justiça, Felicidade, Comunidade, Fraternidade… este jeito de ser e viver que, cá entre nós, chamamos Reino de Deus/Agir de Deus, e que vai acontecendo aos poucos, e é sinal deste Espírito actuante que sabemos ser uma Pessoa e não uma “coisa”.
Será que esta Espírito/Sopro/Vida de Deus não estará em tudo e em todos aqueles que seguem por aí, à procura de fazer acontecer este Reinar de Deus?
Acredito que sim, que este agir de Deus pode acontecer na imaginação de quem procura este Reino, tal como acredito que este agir de Deus acontece no acto de dar um prato de comida quente a quem tem fome e vive na rua.
Às vezes penso que Deus não é assim tão cioso da Sua própria Divindade, como quem tem um copyright exclusivo de todas as boas acções que acontecem. Podemos chamar tantos nomes às atitudes altruístas da humanidade. Cada um, segundo a fé no “deus” em que acredita, pode chamar-lhe o que quiser, que o nosso Deus não se importará certamente com isso… acredito é que de maneira tantas vezes discreta, a nossa humanidade caminha para a sua salvação, para a plena comunhão, seja qual for o seu credo, levamos isso inscrito no mais profundo de nós!… Só quem negar esse “caminhar com alguém”, recusando-se a humanizar-se e humanizar plenamente, ficará só.
Um abraço bom para ti, Miguel. Gosto das tuas partilhas
Caro Manuel,
obrigado pelo teu contributo em fundamentar a minha resposta com a Palavra. A presença do Espírito Santo é particularmente forte nela.
Abraço … Miguel
Obrigado Anawîm pela tua meditação
🙂
Será que esta Espírito/Sopro/Vida de Deus não estará em tudo e em todos aqueles que seguem por aí, à procura de fazer acontecer este Reinar de Deus?
O Espírito Santo sopra onde quer e quando quer, pelo que também creio que o Reino de Deus acontece hoje mais do que pensamos.
Gostei da ligação que fizeste entre Reino de Deus e Agir de Deus. Não sei se tiveste oportunidade de ler um post que escrevi sobre o agir de Deus no contexto da interacção entre ciência e fé, onde concluia que Deus age através dos relacionamentos. Penso que também este pensamento vai ao encontro do teu.
Um abraço na reciprocidade do dom