Faz sentido muita formalidade ainda hoje quando as reuniões são de cariz religioso? Ainda que seja com a presença de autoridades importantes no seio da Igreja?

Todos já estivemos em conferências de cariz católico formais. Em primeiro lugar, algo que sempre me impressionou foi o facto das pessoas que estão na mesa dos palestrantes não olharem para aquele que está a falar. Faz-me impressão porque dava a sensação de um “desligar” daquilo que o outro diz, mesmo que isso não correspondesse à realidade. Se o outro fala durante algum tempo pode doer o pescoço? Sim, mas que doa. Ou então, que se vire a cadeira. Bom, isso pode não ficar lá muito bem na formalidade, certo? Então, talvez seja altura de reflectir sobre um modo de estar que seja mais moderno.

formalidades hoje

Olhar para quem fala constrói família.

Um estar moderno

Na minha opinião, os tempos mudaram, e o tipo de formalidade tem de mudar também. Pela minha experiência, somos uma família de irmãos, filhos do mesmo Pai que está no Céu. Faz sentido outro saber estar que não seja estar em… família?

Há muitos modos de estar em família, mas dada a diversidade de sensibilidades, estar em família num evento grande – para mim – significa estar próximo, olhar nos olhos, não esconder a paixão que se sente pelo que se diz, mesmo se lido.

Mas sem preparação?

Poderias pensar que estar em família implica que não nos preparemos, como o farias se tomasses o evento como mais formal. Penso que seja exactamente o contrário. A preparação é fundamental. Aliás, talvez exija mais de ti do que preparar algo mais formal. Podes pensar – “é isto que gostaria de ouvir se fizesse parte da audiência?”, “mais do que compreenderem o que digo, sentir-se-ão compreendidos?”, “o que proponho como transformativo aos outros foi transformativo para mim?”

Equilíbrio entre a intelectualidade e a experiencialidade

A minha experiência de formalidade é a de uma certa intelectualidade. O que diz fica-se pelo que é intelectual. Pode ser muito estimulante para o pensamento, mas hoje, se não chegar ao coração da experiência concreta de cada um, corre o risco de perder a potencialidade de transformar a vida do outro.

É claro que se estivermos numa conferência de especialidade humanista, como em filosofia, é muito natural que prevaleça a intelectualidade. Mas creio que o desafio do pensamento filosófico seja, hoje também, o de encontrar o modo como pode transformar a nossa vida. Como pode inspirar. Nem que seja através de uma visão do mundo que dê novo sentido e significado ao acordar em cada manhã, ou nos momentos difíceis.

Não há experiência que não influa sobre a intelectualidade, nem intelectualidade que não oriente, de algum modo, a experiência. O desafio estará no equilíbrio de ambas. Assim, uma formalidade em família não procura apenas o que é intelectual, mas enquadra a intelectualidade na experiencialidade.


Chegou o tempo de repensar as formalidades, de modo a que se tornem familiaridades que nos aproximem e nos ajudem a fazer uma experiência fraterna que inspire o agir.